sexta-feira, 20 de setembro de 2019

Zé Luiz Mazziotti



Conheci Zé Luiz Mazziotti  no início dos anos 80 num show em homenagem a Sidney Miller na Sala FUNARTE, junto com Alaíde Costa e Zezé Gonzaga. Lançado em disco algum tempo depois, furou na vitrola. Ainda sei de cor a canção O Bonde. Nunca saiu em cd.
Na Rua São João em São Paulo, ao lado da Baratos Afins, tinha uma loja de discos especializada em música brasileira. O dono era especialista em transformar vinis em cd. Fazia arte gráfica, tudo muito bem feito. Levei o disco lá e ele fez o cd para mim. Está la na cabeceira.
Depois vieram dois discos, um da Continental e outro da Pointer, também não lançados em cd. São deles as melhores interpretações de Violão Vadio e Súplica que conheço. 
Também não consigo me esquecer de uma dueto com Nana Caymmi em Pare de me arranhar.
Em 2003, fui à FNAC Barra para o lançamento do disco em que o cantor interpreta as canções de Chico Buarque. Mais uma obra prima. Esse eu tenho com autógrafo.
De voz mansa e delicada, boa de ouvir, Zé Luiz Mazziotti sempre esteve presente, mesmo que sumisse de vez em quando.
Agora ele aparece de novo com esse disco A Roma, gravado na Itália. Pode-se notar de primeira, a excelência na escolha, a mesma voz delicada, acompanhando-se ao violão. Simples assim. 
E que bom poder ouvir Boca da noite (Toquinho e Vanzolini) e Sem companhia (Ivor Lancelotti e Paulo Pinheiro) na voz de um especialista. E lembrar o quanto essas canções foram ouvidas, vividas, mastigadas.
Consegue emocionar até nas manjadas. É bonito ouvir Anos dourados outra vez, agora com Zé Luiz. Trás um frescor novo para a canção.
No seu tempo sem tempo, Zé Luiz Mazziotti lança mais um disco imprescindível. Obrigado.

terça-feira, 17 de setembro de 2019

Fragmentos

"Eurico Alves, poeta baiano,
Salpicado de orvalho, leite cru e tenro cocô de cabrito.
Sinto muito, mas não posso ir a Feira de Sant'Ana.

Sou poeta da cidade. Meus pulmões viraram máquinas inumanas e aprenderam a respirar o gás carbônico das salas de cinema.
Como o pão que o diabo amassou.
Bebo leite de lata. Falo com A., que é ladrão.
Aperto a mão de B., que é assassino.
Há anos que não vejo romper o sol, que não lavo os olhos nas cores das madrugadas.

Eurico Alves, poeta baiano, Não sou mais digno de respirar o ar puro dos currais da roça."

Manuel Bandeira


É quase o mesmo de sempre: noites de insônia, um domingo perdido, a alma fragmentada. É assim quando tem evento de trabalho no fim de semana. Mesmo que seja num hotel paradisíaco. Mesmo que você esteja por um pouco do tempo com a família. Quando a família vai. Ou pelo menos, parte dela.
A maior vantagem de ir para um hotel all inclusive é quando você chega no check-out e o atendente fala Está tudo certo. Não há armadilhas como copo de água por 9 ou lata de cerveja por 20. Você simplesmente entrega o cartão e vai embora.
O maior problema é que os all inclusive relaxam muito na comida, que é farta, porém muito mal preparada. Uma lagosta linda sem sal e fria. Que saudade do Canyon Coqueirinho!
O resto é isso. Apertar a mão de B, falar com A, etc, etc, e voltar cansado.

Voltei a tempo de assistir a magra e sortuda vitória do Fluminense sobre o Corinthians. Como disse o Alan, melhor do jogo, foi um ufa. Nem eu nem Chicote acreditávamos que o jogo havia terminado.
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E hoje cheguei aqui ouvindo as canções catalãs de Joan Manoel Serrat. Trabalho tentando fluir depois de noites de cansaço. O Itreco ligado, sinal de paz.
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Meu pai certamente viajou muito mais com os filhos do que eu tenho viajado. Eram viagens mais modestas, mas nunca deixamos de ir.
Íamos, eventualmente a São Lourenço. Tínhamos por lá, uma tia avó. E primos jovens como nós. O gosto da água nunca foi embora. Meu pai guardava no porta luvas, um pequeno copo de plástico retangular. Lembrança de São Lourenço.
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Não sei porque nos tornamos filhos tão complicados.
Nos tempos de São Lourenço  e Guarapari, não havia depressão, e só nos entristecia deixar as meninas em Miracema. 


terça-feira, 10 de setembro de 2019

Coisas do Mundo




"Ai meu Deus do céu, eu fui feliz
Bebendo com você
No Bar Luiz, e hoje quem diz
Que havia um riso permanente em nossa boca"

Aldir Blanc e Moacyr Luz, Encontros Cariocas 


Dentro da Barca, li a reportagem sobre o adeus do Bar Luiz. A flor da pele ficou exposta e o olho começou a marejar. Gosto quando mareja, o que é raro. Quando meu irmão morreu, chorei muito. Fez me bem. Mas não consegui chorar quando meus pais morreram. Ficou retido. Pois bem, hoje chorei na  barca. Deixei correr, não foi um choro convulso.


Tenho recordações viscerais daquele bar. Foi ali que nasceu o amor. Numa noite de comemoração de fim de ano entre colegas da empresa, o que não estava escrito em nenhum caderno, aconteceu. E veio aquele amor e a vida pareceu reascender. Já estava caminhando há tempos para a categoria casmurro, só conseguia enxergar trabalho, filhos e alguma canção.
O amor, apesar de estar comigo no dia a dia do trabalho, nunca deu sinais. Começou no Bar Luiz, com a turma, e no Arlequim, só nós dois.

E voltamos muitas vezes para beber e celebrar a vida. E tanta coisa foi aprendida entre uma ida e outra, que parecia o aprendizado de uma vida inteira. Era lá que esquecíamos as desavenças, que aliviávamos os olhos, que transformávamos as dúvidas em chopp preto.

Foi ali também que tomei um porre de chopp esperando Mário e Marila para assistir Paulinho da Viola no João Caetano. Foi a primeira vez que assisti Paulinho, Lá pelas tantas, gritei a plenos pulmões, cheio de alcool do Bar Luiz: Coisas do mundo, minha nega. A platéia riu junto com Paulinho, que logo em seguida cantou a obra prima.

Em tempos mais magros do que esses, ir ao Bar Luiz era uma ostentação. E íamos, eu e Ronaldo, comer aquele kassler com salada de batatas e conversar sobre a vida. Hoje nosso point é o Damasco. Mas continuamos conversando sobre a vida. 

Hoje quando vou à Casa do Choro, olho a Rua da Carioca e só vejo escuridão e loja fechada. Mas nunca deixo de olhar para o outro lado da rua e procurar o Bar Luiz.
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João Gilberto cantando Sampa. Chorei de novo. Não há nada mais delicado.




segunda-feira, 9 de setembro de 2019

O desempregado com filhos

"Ele estava desempregado há muito tempo.
Tinha filhos e do trabalho restavam cadilhos. E da fome sobravam rastilhos.
Disseram-lhe: só te oferecemos emprego se te cortarmos a mão.
Ele estava desempregado há mais tempo do que sabia, e mesmo se não queria, tinha filhos, aceitou.
Logo ali no cepo a deixou.
A mão, a mão, a mão.
Outra vez despedido de novo procurou emprego.
Só te oferecemos emprego se te cortarmos a mão, aquela que te resta, a segunda mão.
Ele estava desempregado, tinha filhos, aceitou.
Porque o tempo lhe fugia entre os últimos dedos lhe fugia,
a mão, o tempo, a mão.
Porque o tempo lhe fugia, entre os últimos dedos lhe fugia,
a mão, o tempo, a mão.
E quando um dia lhe disseram; só tens emprego se te cortarmos a cabeça.
Ele estava desempregado há mais tempo do que podia, tinha filhos, aceitou, e baixando a cabeça, aceitou.
Porque o tempo lhe fugia, entre os últimos dedos lhe fugia,
a mão, o tempo, a mão."
Gonçalo Tavares

Pode ser ouvido aqui: https://www.youtube.com/watch?v=nArCyiaits8
Na falta de uma inspiração para escrever bobagens (ando muito reflexivo e cansado, sem conseguir transportar para o blog qualquer bobagem que seja), copio os poemas que li e gostei de ler nesses últimos anos sem desconversa.

sexta-feira, 6 de setembro de 2019

Inventário


"Quarto:
–          uma cama de casal box
–          roupa de cama ( 2 lençóis-casal, 1 edredom, 3 jogos de fronhas)
–          duas cadeiras de plástico
–          um cabideiro
–          um criado-mudo
–          um guarda-roupa duas portas
–          um colchão solteiro
–          ventilador de teto
–          uma escrivaninha desmontada
Corredor:
–          dez prateleiras brancas
–          duas lâmpadas com suporte
–          uma estante com cinco prateleiras contendo 314 livros
Banheiro:
–          box de vidro
–          um chuveiro elétrico
–          um armário de parede-espelho
–          um lustre
Sala:
–          dois quadros
–          uma escrivaninha
–          uma mesa de centro
–          um sofá dois lugares
–           uma estante
–          um aparelho de som
–          um aparelho de telefone
–          uma televisão marca Gradiente
–          um mimeógrafo
–          um interfone “Max-com”
–          um lustre de teto
–          um modem-Wi-Fi, quatro controles-remotos, uma fechadura com chave-tetra.
Cozinha:
–          um guarda-comida de parede
–          um liquidificador
–          uma geladeira
–          um fogão quatro-bocas com botijão e mangueira
–          pia inox com armário
–          copos, panelas, louças e talheres. Duas lâmpadas florescentes com suporte. Um relógio de parede.
–          filtro de água
Área de serviço:
–          um ferro de passar roupas, tábua de passar roupas.
–          uma escada
–          uma máquina de lavar roupas, um tanque, um armário, varais,
Constam:
–          Todas as tomadas e interruptores funcionando.
–          Um coração despedaçado"
Marcelo Mirisola

Prá gravar aqui e não esquecer mais.

terça-feira, 3 de setembro de 2019

Essas tardes assim

Quando a diretoria do Fluminense demitiu Fernando Diniz, fiquei muito dividido. Confesso que cheguei a achar que era a hora mesmo. O time havia perdido para o CSA em casa depois de desperdiçar inúmeras chances de gol.
O tempo está comprovando que a diretoria (e eu, eventualmente) estava errada.  O time perdeu a última oportunidade título esse ano num empate ruim com o Corínthians, Jogou confuso, misturando Osvaldo com Diniz, duas escolas bem distintas. Quem afirmaria que o resultado seria o mesmo com Diniz?
Vendo agora com clareza, acho que o técnico deveria ter tido pelo menos a chance de levar o time à semi-final da Sul Americana.
E eis que ontem, com Osvaldo, a história da derrota para o CSA se repetiu de forma idêntica com o Avaí. O time continua o mesmo. A culpa não pode ser atribuída ao técnico.
Tenho muitas restrições com relação ao trabalho de Osvaldo de Oliveira. Acho que estamos pagando para ver o time rebaixado.
Antes, pelo menos jogava bem. 
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Resolvi dar a devida atenção ao novo disco de Rosa Passos, Amanhã vai ser verão, comprado no início do ano na Pops Discos, na Rua Teodoro Sampaio em São Paulo, um dos últimos oásis sobreviventes, que vende boa música nesse país.
Talvez seja melhor começar por Partilha, a segunda música. É uma revisão intimista de Trocando em miúdos (Chico e Francis) e Altos e baixos (Aldir e Suely). Uma vez Chico Buarque afirmou que Eu te amo se tratava de uma de suas canções de status. Talvez por ter sido composta com Tom Jobim. Pois bem, Partilha é uma canção de status. O dedo ficava nervoso quando ela acabava e voltava várias vezes ao início para sentir a intensidade da letra.
Não vou fazer mais nenhum comentário sobre qualquer canção em especial, pois acabei me apaixonado por Partilha  e não parei de ouvi-la.
Bom, desculpe, não posso deixar de citar uma canção de Rosa do repertório de Nana: Essa tardes assim. Quem ouviu e viveu o disco Mudança dos Ventos (1980), sabe bem da beleza dessa música. Era a sexta faixa do lado B, "a que dói mais no inverno".
O resto do disco segue com canções delicadas, ora bolero, ora canção. Rosa Passos é a melhor intérprete de si mesma. Merecia estar em todas as FMs do país.


segunda-feira, 2 de setembro de 2019

Você não faz a menor ideia


Adoro coxinha de galinha. Eu era menino, recebia a semanada do meu pai no domingo e a programação era matinê no Cine XV, seguida de coxinha com coca-cola no Bar Pracinha. Eu era feliz com meus poucos trocados e suas possibilidades concretas.
Meus poucos trocados que meu pai me dava todo domingo depois da missa iam embora na noite de domingo mesmo. Já era consumista na época. Só mais tarde com a descoberta dos discos é que passei a ser mais econômico. Guardava pra comprar discos na Sete de Setembro. Mas não abria mão das coxinhas. 
O Bar Pracinha vai ficar sempre na minha memória, assim como o quibe do Seu Abdo e o misto quente do Zé Careca, todos próximos da minha gula, mas consumidos em momentos diferentes.
O Bar do Seu Abdo era para se ir em família, o misto era mais para feriados, a rotina mesmo eram as coxinhas.
Mais tarde, com o fechamento do Bar Pracinha, passei a comê-las no Kiskina Chopp. Era uma coxinha crocante, que valia a pena aguardar sair quentinha para comer.
Em Niterói, comia no City Niterói em frente às barcas, que tinha uma coxinha creme deliciosa, cujo recheio era preparado na própria coxa. Ela também podia ser consumida na Casa Cavé e ainda pode ser encontrada na Confeitaria Colombo.
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Toda vez que passo em frente ao City e vejo uma drogaria, dá uma dor e uma saudade danada. Já foi o tempo das coxinhas.
Fecharam o Cine XV, o Kiskina Chopp, o Bar Pracinha, o City Niterói, a Casa Cavé. Fechou a água hidrovita que tinha do lado do City, que curava ressacas homéricas. A maioria virou farmácia.  E eu acabei órfão das boas coxinhas, embora continue gostando delas. Tenho preferido as miudinhas porque as grandes estão sempre massudas e com recheio seco.
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Que bom poder escrever bobagens depois de ter passado por um longo período de insônia entre duas viagens de noite inteira e a Basiléia no meio. Não há nada pior para o insone do que tomar remédios ... e não dormir.

Triste cuíca

Aceitar o castigo imerecido Não por faqueza, mas por altivez No tormento mais fundo, o teu gemido Trocar um grito de ódio a quem o fez As de...