quarta-feira, 30 de agosto de 2023

Uma coca cola e um pão de sal com salsicha

Fiquei bestado dessa arte de colocar preço em discos usados. Os livros de John Dunning estão me introduzindo na metodologia de precificação de livros raros. Um aprendizado e tanto! As primeiras edições, com capas impecáveis, autografadas pelo autor, sem carimbos ou ranhuras, valem muito. Pelo menos valiam em 1986, que é quando se passa a história. 

Para discos, não há um critério ordenado. Por exemplo, a loja Passadiscos precificou os cds de Otto a 99 reais e o Ella abraça Jobim a 24 reais. Não faço a menor ideia de como se chegou a esse cálculo. Não faço idéia de por que os discos do Otto estão tão valorizados hoje em dia. São bons discos, mas não passam disso. Além disso, estão todos no streaming, podem ser ouvidos sem custo, ainda que a sonoridade não seja a ideal.

Qualquer coletânea usada possui preço médio de 5. Qualquer DVD (incluindo o Vento Bravo de Edu Lobo) sai em média por 10. Quem é que perde tempo com DVDs hoje em dia? Será que eu sou o único lunático que ainda assiste (e compra) esses disquinhos?

Acredito ter hoje em torno de 5.000 discos. Deve ter muita coisa rara, ultra rara e muita coisa cujo valor atribuido não passaria de 5. Não importa. para mim todos têm o mesmo valor inestimável, não há preço que pague  Prefiro dar. Quando tenho repetido, dou. Mas nunca venderia.

Tivemos um problema sério com os cds. Na primeira década de existência, eles eram masterizados de forma ruim, de modo que saíam abafados. O primeiro disco do Elomar é um sacrilégio e nunca saiu uma revisão. Mas isso já mudou. Hoje em dia, a qualidade do áudio de um cd é tão boa quanto a do vinil. Foi por isso que nunca entrei nessa onda. Nunca voltei ao vinil. Tenho uns poucos, não mais que 300, a maioria herdados de uma tia querida que já se foi.

Marcelo Fróes, um pescador de pérolas, tem se aprimorado em fazer reedições de 300 unidades de velhos discos. Logo serão raros e ultra raros. O do Rui Maurity, que tem Serafim e seus filhos, eu não consegui.

O Sesc lançou 2.000 unidades de João Gilberto, Relicário. Tive que comprar na apple (arquivo) para ouvir com melhor ouvido. João ainda me deixa comovido como o diabo. Parece que os japoneses compraram tudo. Agora relançaram mais uma tiragem pequena. Quase comprei dois para ter um de reserva.

Meus discos ficarão para os filhos. Eles que decidam dar cabo deles quando eu me for. Até lá, contarei a história de cada um para quem quiser me visitar.

..........................................

Fiquei velho como os discos. Amanhã completo 62 anos. Não são os discos que me fazem acordar todo dia e encarar o trabalho pesado. São meus filhos.



segunda-feira, 28 de agosto de 2023

Até quem sabe

Nunca mais vai beber minhas lágrimas, não vai não

Me fazer de gato e sapato, não vai mesmo não

Hermínio Belo


Hesitei muitas vezes em voltar àquele sítio. Tinha deixado lá meu carro, minhas roupas, minhas parcas esperanças, meus anos de vida. 

Cada final de semana, eu protelava mais um, até que ontem, naquele dia frio e chuvoso, percebi que já tinha passado da hora. E aí eu fui.

O coração, que se enganou novamente e novamente quis acreditar, batia esquisito, arrítmico, quase falhando. Tentei ser cortês o quanto púde, mas a ferida ainda estava aberta. Ainda latejava. Demora cicatrizar. Acho que não há mais tempo para cicatriz.

Que amor é esse de muitas idas, muitas voltas, que nunca conseguiu se encontrar? Amor de lateralidade, que só coube a mim e a mais ninguém. Quantas dezenas de vezes errei em nome dele?

Saí dali com a voz presa, o dedo anelar amputado, e a sensação de que perdi outra vez, e que o ciclo de perda e ganho tinha finalmente se encerrado. "Até um dia, até talvez, até quem sabe..."

terça-feira, 22 de agosto de 2023

Ainda há disquerias em Buenos Aires

Viajei com o trabalho de baixo do braço e o trabalho acompanhou-me por todo o percurso. O zap e o e-mail não pararam . Na Rua Florida, em Porto Madero, no Hilton Hotel, em qualquer tempo eu me pegava a olhar o telefone e responder, já com vontade de quebrar aquilo. A viagem não seguia seu ritmo de lazer e repouso. Além disso, tinha um congresso por trás da viagem, que tomou conta do sábado.

Senti falta do meu filho para andar comigo por aquelas lojas, comprei pouco sem ele. Sem ele, achei melhor procurar as lojas de disco. E pasmem, elas existem. Não com a fartura de antigamente, mas existem. Próximo ao Palacio das Papas Fritas, que é sempre minha primeira visita, há várias delas, mas uma em especial, numa esquina da Corrientes, duas quadras após o Palacio, me encantou bastante. Apesar do péssimo atendimento (não nos entendem e não fazem a menor questão de entender), consegui encontrar discos frescos de Silvio Rodrigues, Tabare Leyton, um Serrat e Sabina diferente dos dois já lançados, coletâneas de tango, etc. Apesar do péssimo atendimento, repito, senti que a música está viva ali. Fui também aos dois Ateneus da Florida, e também comprei discos nas duas.

O Pálacio está cada vez mais decadente, mas as papas continuam iguais, e a carne muito boa também. Comi um filé com papas acompanhado de duas pepsis lights, custou 90.000 pesos, cerca de 70 reais. Também comi carne em Porto Madero, na Cabaña de Las Lislas, mas não sei precificar o quanto foi gasto, porque fez parte do evento. O dólar era comprado na Florida por 720 pesos. Cem dólares já eram suficientes para sair rico daquelas casas de câmbio.

Tive medo de perder o vôo da volta porque o check-in simplesmente não abria no dia anterior. Tive que fazê-lo na fila da Gol, mas não teve dificuldade nenhuma. O vôo saiu pontualmente e chegou antes do previsto. 

As voltas me estressam demais. Sempre fico com receio de atrasos, cancelamentos, de perder o passaporte, de me pararem na alfândega. Em geral, isso nunca acontece,  mas é sempre um sofrimento. Quem me acompanha, sabe dos meus abismos.

A estrada serviu para terminar o estupendo Edições Perigosas, de John Dunning. História de livreiros passada em 1986, época em que eu era rato de sebos do centro do Rio. Há muitos trechos que poderia escrever aqui para não esquecer e muitas passagens em que eu me vi ali em Denver. 

Estou alternando ficção e poesia. Antes, li Ninguém quis ver, Bruna Mitrano. A poesia dela é visceral, mas não é exatamente o tipo de poesia que eu goste.

Agora comecei Glauco Matoso, Cem novidades, com seus dissonetos irretocáveis. 

..........................................................................

Queria pedir perdão aos meus leitores botaguenses (total - zero!) pelo texto anterior. Quem viu a virada do Botafogo sobre o Inter, sabe que estamos falando do melhor time do Brasil em atividade, que chegou ao topo por muitos méritos. Pode não se comparar a elencos mais robustos, como Flamengo e Plameiras (e até o Fluminense, por que não?), mas é extremamente bem organizado e sabe jogar bem. 

Travado

"Diferente o samba fica Sem ter a triste cuíca que gemia como um boi A Zizica está sorrindo Esconderam o Laurindo Mas não se sabe onde ...