sábado, 15 de agosto de 2020

Eu queria cantar-te um fado





"O sal das minhas lágrimas de amor criou o mar"

Vinícius de Moraes


Logo para você que detesta fados.Que não enxerga as almas sombrias, as noites vazias, as sombras bizarras. 

Eu me lembro exatamente desse ponto de corte. Foi numa viagem de carro para não sei aonde, em que eu ainda compartilhava minhas canções de afeto em alto volume e você gostava (será?). Era uma antologia longa de fados e lá pelo meio, quando Zambujo cantava A casa fechada, ouvi o primeiro chilique musical: vou ter que continuar ouvindo isso aí? A pergunta, se não foi exatamente essa, foi parecida. Dali para frente, o rádio do carro, por todos os anos seguintes praticamente emudeceu.

Hoje eu pensei de novo numa cena surreal: no dia do nosso casamento, após a troca de alianças, eu teria contratado um violão e um bandolim e cantaria um fado. Não está muito claro qual deles. mas na maior parte das vezes eu penso nesse que dá título ao texto. Não está muito claro o número de aulas de canto que teria que fazer para chegar perto de um Carlos do Carmo. Obviamente nunca chegarei.

Sonhei muitas vezes, como se pudesse convencê-la, que dessa vez o fado entraria em você de um jeito novo, e você não muxoxaria nem torceria o nariz. Sonhei que seria como aquela noite lá no início, em que tomamos vinho e ouvimos Chavela Vargas, e seus olhos felizes pareciam gostar.

Não sei também se os convidados iriam respeitar a minha escolha, acredito que muitos ririam do meu fado triste. Certo é, que nesse meu sonho inútil, tudo mudaria na segunda estrofe. Um silêncio de pedras tomaria conta da casa de festas e só se ouviria minha voz. A minha voz de Carlos do Carmo, cantando esse fado estranho e magoado, que pudesse ser sentido tão na alma como eu.


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