quarta-feira, 18 de outubro de 2023

Roteiro inútil

Se vc estivesse aqui comigo,eu te levaria ao Damasco na Rosário, onde se faz um homus muito parecido com o do Seu Abdo, que comíamos invariavelmente aos domingos. Iríamos ao Capela comer um cabrito a portuguesa, que você apreciava tanto. Passearíamos pelo velho centro e pela Colombo, pelo Real Gabinete Português de Leitura, pela estátua do Pixinguinha na Rua da Travessa, pelo Paço do Império. 

Eu te levaria a conhecer o Mosteiro de São Bento, tão afeito à sua fé inabalável. E aprenderia um pouco mais do tanto que você me ensinou e eu desaprendi.

Se ainda pudesse estar com você, eu levaria a cabo meu sonho de te dar de presente a minha S10, que você gostava tanto e nunca pode ter. Quantas vezes estive na esquina da Rua das Flores e a ideia me ocorreu? De que vale tudo isso agora, se não tenho mais nem você nem a S10?

E viajaríamos o quanto pudéssemos, pois viagem e cinema eram pela ordem, as coisas que você mais gostava de fazer. Eu te levaria aos lugares que mais gostei: a passear pelo Porto Madero, navegar pelo Rio Tejo, caminhar pela Paulista, andar de gôndola em Veneza. E assistiríamos o fado em Lisboa, o tango em Buenos Aires, ao choro no centro do Rio. 

E passaríamos o domingo de cinema em cinema, assistindo aos lançamentos do mês, preferencialmente os faroestes e os filmes policiais que você esfregava as mãos em cada cena que te agradava.

E depois sentaríamos num café para conversar. Porque você, como eu, preferia o silêncio, preferia a pausa entre as palavras, mas uma vez ou outra, abria o verbo e falávamos muito.

Se estivesse aqui, eu faria o que pudesse para corrigir a minha omissão, a minha indiferença e o meu egoísmo. Eu te diria o quanto eu senti ter te perdido sem sequer ter a chance de te dar um último abraço.

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