"Vivi, estudei, amei e até cri,
E hoje não há mendigo que eu não inveje só por não ser eu.
Olho a cada um, os andrajos e as chagas e a mentira.
E penso: talvez nunca vivesses, nem estudasses, nem amasses, nem cresses
(Porque é possível fazer a realidade sem fazer nada disso);
Talvez tenhas existido apenas como um lagarto a quem cortam o rabo
E que é rabo para aquém do lagarto remexidamente.
Fiz de mim o que não soube
E o que podia fazer de mim não o fiz.
O dominó que vesti era errado
Conheceram-me logo por quem não era e não desmenti, e perdi-me.
Quando quis tirar a máscara,
Estava pegada à cara.
Quando a tirei e me vi ao espelho,
Já tinha envelhecido.
Estava bêbado, já não sabia vestir o dominó que não tinha tirado.
Deitei fora a máscara e dormi no vestiário
Como um cão tolerado pela gerência
Por ser inofensivo
E vou escrever esta história para provar que sou sublime."
Álvaro de Campos
E hoje não há mendigo que eu não inveje só por não ser eu.
Olho a cada um, os andrajos e as chagas e a mentira.
E penso: talvez nunca vivesses, nem estudasses, nem amasses, nem cresses
(Porque é possível fazer a realidade sem fazer nada disso);
Talvez tenhas existido apenas como um lagarto a quem cortam o rabo
E que é rabo para aquém do lagarto remexidamente.
Fiz de mim o que não soube
E o que podia fazer de mim não o fiz.
O dominó que vesti era errado
Conheceram-me logo por quem não era e não desmenti, e perdi-me.
Quando quis tirar a máscara,
Estava pegada à cara.
Quando a tirei e me vi ao espelho,
Já tinha envelhecido.
Estava bêbado, já não sabia vestir o dominó que não tinha tirado.
Deitei fora a máscara e dormi no vestiário
Como um cão tolerado pela gerência
Por ser inofensivo
E vou escrever esta história para provar que sou sublime."
Álvaro de Campos
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