domingo, 8 de agosto de 2010

Meu pai

A gente aprendeu a acordar e a tomar a benção bem cedinho, porque meu pai invariavelmente acordava muito cedo pro trabalho. Ainda hoje acorda. Os anos duros não lhe deram boa vida e o novo tempo acabou se revelando ainda mais duro.
A apereza dos anos não tirou-lhe a força. Sempre manteve uma rotina invejável de trabalho pesado. Ainda hoje é assim. Ainda hoje, o invejo.
Invejo o fato dele chegar em casa todo dia na hora do almoço e encontrar sempre a mesa posta, o arroz fresquinho, o acolhimento familiar. Almoço normalmente em restaurantes a quilo, minha familia é minha equipe de trabalho e o almoço acaba quase sempre sendo parte do trabalho.
Nunca consegui estabelecer nenhum ritmo pra minha vida. Não sei exatamente onde moro, nem sei pra onde vou, muito menos a que tempo. Sempre essa coisa anárquica de querer estar em todos e em nenhum lugar ao mesmo tempo. Mas meu pai esteve sempre ali.
Está ali hoje vendo seu faroeste noturno. E que ninguém lhe aborreça na hora do faroeste! Ainda fala com saudade dos velhos cantores que amava. Do luto que passou quando Francisco Alves morreu.
Meu pai nunca fez concessões musicais. Cresceu ouvindo o dó de peito. Chico Alves, Carlos Galhardo, Nelson Gonçaves, Silvio Caldas eram a rádio lá de casa. Aprendi a gostar deles e das raízes da nossa música pelo discos de 78 rpm do meu pai. Quebrei alguns. Fiquei de castigo muitas vezes. Adorava fuçar sua discoteca e sua eletrola telefunken. Espero que seu coração musical não silencie nunca.

2 comentários:

Unknown disse...

Belíssima homenagem.
Invejável, mesmo.
Bj

Ti disse...

Um bju bem grande p teu pai e um p vc. Eu sei o que "seu Carlinhos"representa na tua vida, muito bonito o texto. bjus

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